Os 10 melhores filmes de cangaço

por Gustavo Menezes

O cangaço vem inspirando os fazedores de cinema no Brasil desde que a câmera do mascate libanês Benjamin Abrahão registrou o bando de Lampião em 1937. O Cangaceiro (Lima Barreto, 1953) conquistou o Festival de Cannes e inaugurou de fato o nordestern, gênero que transpunha o faroeste americano para o sertão. A chanchada logo atacaria nas paródias do gênero, de Os Três Cangaceiros (Victor Lima, 1959) a O Cangaceiro Trapalhão (Daniel Filho, 1983), e até mesmo a pornochanchada, o faroeste espaguete e o manguebeat viriam somar ao gênero nas décadas seguintes.

10. O Cangaceiro (1953)
Direção: Lima Barreto

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Mesmo incorreto no retrato simplista que faz do fenômeno do cangaço, transplantando os papéis do western para o sertão (o cangaceiro toma o lugar do bandido mexicano) e macaqueando roteiro, técnica e estética do cinema americano, é de importância  histórica devido a sua repercussão internacional e por marcar, simultaneamente, o início do nordestern e o fim da Vera Cruz. Também iniciou a longa lista de papéis de cangaceiro na carreira de Milton Ribeiro, que se tornaria figura carimbada do gênero pelas próximas duas décadas.

9. Corisco & Dadá (1996)
Direção: Rosemberg Cariry

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Esta pungente reconstituição cronológica da trajetória do segundo casal de cangaceiros mais famoso da história chama atenção pela crueza e seriedade com que trata da violência inerente ao tema. Feita no início da Retomada, ajudou a alavancar as carreiras de Dira Paes e Chico Díaz, ambos com performances de respeito nos papéis-título. A trilha original é do Quinteto Violado.

8. Os Últimos Cangaceiros (2011)
Direção: Wolney Oliveira

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Um casal de ex-integrantes do bando de Lampião é descoberto após 70 anos vivendo sob pseudônimos. A partir daí, Durvinha e Moreno fazem as pazes com a memória, recontando suas trajetórias antes, durante e depois do cangaço, com riqueza de detalhes. O filme então segue a recepção dos dois após a revelação do segredo septuagenário, analisando como a visão sobre o fenômeno do cangaço mudou no Brasil. Conta com depoimentos de especialistas, ex-volantes e outros ex-cangaceiros, além de imagens de arquivo preciosas.

7. Lampião, o Rei do Cangaço (1963)
Direção: Carlos Coimbra

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Carlos Coimbra foi, sem dúvida, o maior herdeiro d’O Cangaceiro. Com várias contribuições de peso ao nordestern, ajudou a estabelecer o gênero e a manter vivo no cinema o interesse pelo bando de Lampião. Neste, que considero seu melhor filme de cangaço, ele parte do imaginário popular para recriar os últimos dias de Lampião e Maria Bonita (encarnados muito bem por Leonardo Villar e Vanja Orico). A trilha é do maestro Gabriel Migliori e a fotografia, de Tony Rabatoni.

6. O Cangaceiro Trapalhão (1983)
Direção: Daniel Filho

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Nas três décadas em que fizeram sucesso, nada escapou à veia cômica dos Trapalhões. Valendo-se da fama da minissérie Lampião e Maria Bonita, produzida pela Globo no ano anterior, a trupe convidou Nelson Xavier e Tânia Alves para reprisar os papéis do casal de cangaceiros e adicionou à trama o clichê da troca de identidades. Didi Mocó então se torna sósia do “rei do sertão”, que anda perseguido pelo Tenente Zé Bezerra (José Dumont, mais ou menos reprisando seu Zé Rufino da minissérie). Com diálogos afiadíssimos de Chico Anísio, o filme casa muito bem o estilo de fantasia e aventura dos Trapalhões com a mitologia do cangaço e do sertão, resultando num dos melhores filmes do grupo.

5. O Último Dia de Lampião (1975)
Direção: Maurice Capovilla

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Docudrama que reconstitui a emboscada à gruta de Angicos que vitimou Lampião e boa parte de seu bando. Conta com depoimentos fundamentais de testemunhas oculares da história. O cuidado a detalhes na encenação é tanto que a pesquisa de roteiro contou com ajuda do cangaçólogo Antônio Amaury Corrêa de Araújo, e os figurinos, das ex-cangaceiras Dadá e Sila.

4. O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro (1969)
Direção: Glauber Rocha

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Nesta continuação espiritual de Deus e o Diabo na Terra do Sol, o matador Antônio das Mortes (Mauricio do Valle) vai à fictícia cidadezinha Jardim das Piranhas para acabar com Coirana (Lorival Pariz), novo líder cangaceiro que surgiu por lá. No processo, questiona seus princípios e vira-se contra o latifundiário do local. Mesmo tendo mais cara de western e filme de ação que seu antecessor, o Dragão não deixa de lado o fervor mítico-popular característico dos filmes de Glauber.

3. Baile Perfumado (1997)
Direção: Lírio Ferreira e Paulo Caldas

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No calor da Retomada, Pernambuco já dava sinais de seu futuro glorioso com este marco. Aqui, o bando de Lampião (Luiz Carlos Vasconcelos) é mostrado pelo olhar do mascate libanês Benjamin Abrahão (Duda Mamberti), autor das únicas imagens em movimento do grupo e testemunha ocular de atributos pouco comentados do rei do cangaço. Cheio de energia, o filme acertadamente tem trilha original composta pelos cabeças do incipiente movimento manguebeat – nomes como Chico Science, Fred 04 e Siba.

2.  Memória do Cangaço (1964)
Direção: Paulo Gil Soares

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Hoje um clássico do documentário nacional, este média-metragem da Caravana Farkas traça a história do cangaceirismo, do início ao fim, com base em pesquisa cuidadosa. Além de especular sobre as origens do fenômeno – apresentando até teses racistas da medicina da época -, o filme tem depoimentos valiosos, como o do coronel José Rufino, celebrado assassino de cangaceiros, e o do ex-cangaceiro Saracura.

1. Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964)
Direção: Glauber Rocha

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Com uma linguagem inovadora, que inclui a incorporação de narração em versos de cordel e a fotografia inspirada na xilogravura, Deus e o Diabo representou, também, uma visão inaugural na cinematografia brasileira sobre o fenômeno do cangaço. Rejeitando a espetacularização acrítica d’O Cangaceiro  e seus seguidores, Glauber Rocha ressignifica aqui os códigos do western e apresenta uma tese incontornável: o cangaceirismo e o messianismo são frutos do mesmo horror; são duas respostas equivalentes ao mesmo problema da fome e da violência insolúveis. Mas são, antes de tudo, alienação.